Despacho de Julgamento nº 89/2018/GFP
Despacho de Julgamento nº 89/2018/GFP/SFC
Fiscalizada: EMPRESA MARANHENSE DE ADMINISTRAÇÃO PORTUÁRIA – EMAP (03.650.060/0001-48)
CNPJ: 03.650.060/0001-48
Processo: 50300.011803/2018-11
Auto de Infração: 3309-0/2018/URESL (SEI 0539975), lavrado em 06/07/2018, com data de infração para o Fato 1 em 22/12/2017 e 17/01/2018, e para o Fato 2 em 29/05/2018
EMENTA: PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. JULGAMENTO RECURSAL. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. FISCALIZAÇÃO EXTRAORDINÁRIA. AUTO DE INFRAÇÃO DE OFÍCIO. PORTO DO ITAQUI. SÃO LUÍS/MA. AUTORIDADE PORTUÁRIA. EMPRESA MARANHENSE DE ADMINISTRAÇÃO PORTUÁRIA – EMAP. CNPJ 03.650.060/0001-48. TRANSFERÊNCIA IRREGULAR DE RECURSOS FINANCEIROS PARA O TESOURO DO ESTADO DO MARANHÃO A TÍTULO DE JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. ART. 33, INCISO XX, DA RESOLUÇÃO 3.274-ANTAQ, DE 06/02/2014. MULTA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. ABSTER-SE DE REALIZAR, A QUALQUER TÍTULO, TRANSFERÊNCIA DE RECEITAS PORTUÁRIAS, ORIUNDAS DO CONVÊNIO DE DELEGAÇÃO Nº 16/2000, AO ESTADO DO MARANHÃO E AO PRÓPRIO PATRIMÔNIO DA EMAP.
INTRODUÇÃO
1. Trata-se de Recurso Administrativo (SEI 0614933) interposto pela Empresa Maranhense de Administração Portuária – EMAP, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 03.650.060/0001-48 (SEI 0668678), Autoridade Portuária do Porto do Itaqui e interveniente do delegatário, Estado do Maranhão, no Convênio de Delegação nº 16/2000 (SEI 0476072), em face da decisão proferida pelo Chefe da Unidade Regional São Luís – URESL. Note-se que o Porto do Itaqui foi administrado pela Companhia Docas do Maranhão (Codomar), subordinada ao Governo Federal, de 1973 até 2001. Em 01/02/2001, por aquele Convênio entre a União, por meio do Ministério dos Transportes, e o Governo do Estado do Maranhão, o Porto passou a ser gerenciado pela EMAP.
2. Na decisão do Chefe da URESL, qual seja, Despacho de Julgamento nº 12/2018/SFC-ANTAQ (SEI 0591064), determinou-se a aplicação de multa no valor de R$ 125.108,56 (cento e vinte e cinco mil cento e oito reais e cinquenta e seis centavos), por ter a EMAP transferido recursos financeiros a título de Juros Sobre Capital Próprio – JSCP, nos exercícios contábeis de 2015 a 2017, ao Tesouro do Estado do Maranhão.
3. A EMAP teria descumprido a Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, do Convênio de Delegação nº 16/2000, que obrigava a delegatária interveniente a reaplicar todas as receitas advindas da exploração e administração do Porto e demais áreas delegadas em custeio e investimentos nessas mesmas áreas e instalações portuárias, caracterizando a infração tipificada no art. 33, inciso XX, da norma aprovada pela Resolução nº 3.274/2014-ANTAQ.
4. Com fulcro no art. 45 da norma aprovada pela Resolução nº 3.259/2014-ANTAQ, a EMAP foi cientificada da decisão por meio do Ofício nº 145/2018/URESL/SFC-ANTAQ (SEI 0597836), recebido em 21/09/2018 (SEI 0599719), sendo-lhe concedido o prazo de 30 (trinta) dias para interposição de Recurso. Em 11/10/2018, portanto, tempestivamente, a empresa interpôs Recurso (SEI 0614933) na Unidade Regional.
5. Em atenção aos arts. 67 e 68, inciso I, da norma aprovada pela Resolução nº 3.259/2014-ANTAQ, aquela Autoridade Julgadora Originária, em seu Despacho (SEI 0616198), analisou o Recurso e decidiu por manter a decisão, encaminhando os autos a esta Autoridade Recursal.
FUNDAMENTOS
Do Processo nº 50300.006065/2018-90
6. Em primeiro momento, em 06/04/2018 a EMAP protocolou na sede da URESL o Ofício nº 15/2018-GEJUR/EMAP (SEI 0476017), pelo qual informou ter realizado transferência a título de Juros Sobre Capital Próprio – JSCP, referente aos exercícios contábeis dos anos de 2015 a 2017, para a conta do Tesouro do Estado do Maranhão, em cumprimento a determinação expressa da Secretaria de Planejamento e Orçamento do Estado do Maranhão (Ofício nº 702/2017-GAB/SEPLAN), embasada no Parecer nº 2271/2017-ASS-PGE/MA, segundo a qual poderia destinar ao seu ente controlador, o Estado do Maranhão, as receitas financeiras provenientes dos rendimentos das aplicações das receitas da empresa, a despeito da obrigação de reaplicar todas as receitas portuárias no Porto do Itaqui, prevista na Cláusula Terceira do Convênio de Delegação nº 16/2000 (SEI 0476072).
7. A Unidade Regional de São Luís – URESL instaurou então o Processo nº 50300.006065/2018-90, entendendo pela irregularidade da operação (Despacho SEI 0476245). Em resposta ao Ofício nº 59/2018/URESL/SFC (SEI 0481949), a EMAP protocolou na URESL o Ofício nº 139/2018-PRE-EMAP (SEI 0506507), no qual respondeu aos questionamentos feitos, aduzindo que a composição do seu capital social era 100% do Estado do Maranhão, no valor de R$ 334.589.402,61, e que foram transferidos valores pela empresa àquele Estado, dos quais R$ 37.168.925,49 em 22/12/2017 (R$ 14.006.660,13 de JSCP do exercício de 2015, R$ 22.461.932,13 de 2016 e R$ 700.333,00 de 2017); e R$ 23.988.993,71 em 17/01/2018 de JSCP de 2017.
8. A URESL encaminhou aqueles autos à Gerência de Fiscalização de Portos e Instalações Portuárias – GFP que, pelo Parecer Técnico nº 13/2018/GFP/SFC (SEI 0507006), corroborou o entendimento do Despacho URESL (SEI 0476245), asseverando que a composição do capital social somando R$ 334.589.402,61 em 31/03/2018 era fruto da inclusão do produto da tarifa portuária gerada pelos bens operacionais da União advindos do acervo patrimonial do Porto. Ainda, a EMAP somente poderia fazer aumento de capital com recursos repassados pelo Tesouro do Estado, por não serem as receitas portuárias próprias, mas administradas (e também os lucros apurados nos finais de cada exercício), com finalidade e aplicação regida pela Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, do Convênio de Delegação. Recomendou assim que se determinasse à EMAP a devolução dos valores retirados indevidamente, com juros e atualização monetária, sob pena de apuração de responsabilidade da Diretoria daquela empresa.
9. O Parecer foi aprovado pelo Despacho do Gerente (SEI 0510432), sugerindo o envio dos autos à Diretoria Colegiada para decisão sobre o pagamento de Juros Sobre Capital Próprio da EMAP ao Estado do Maranhão, “visando inibir de vez qualquer artifício para transferir recursos tarifários aos Tesouros Estaduais dos Portos que estão sob administração delegada e determinar que a EMAP faça devolução dos valores retirados indevidamente, com juros e atualização monetária, sob pena de apuração de responsabilidade da Diretoria daquela empresa”.
10. A Superintendência de Fiscalização e Coordenação das Unidades Regionais – SFC (SEI 0528917) solicitou manifestação formal da Procuradoria Federal junto à ANTAQ – PFA, considerando os questionamentos sugeridos pela URESL em Despacho (SEI 0476245). Ato contínuo, a Procuradoria formulou o Parecer Jurídico nº 70/2018/NCA/PFANTAQ/PGF/AGU (SEI 0538127), entendendo que as receitas financeiras da EMAP a título de JSCP eram receitas portuárias, resultado da exploração das instalações delegadas, e deveriam ter sido aplicadas exclusivamente no custeio das atividades delegadas, na manutenção das instalações e em investimentos no Porto e demais áreas delegadas; que os valores não podiam ser distribuídos ao Estado do Maranhão, único sócio da EMAP, nem ser utilizados para incrementar o capital da empresa pública estadual, constituindo descumprimento ao Convênio de Delegação a transferência dos valores ao Estado por meio de JSCP e à EMAP por meio de aumentos do seu capital social.
11. Pelo Despacho nº 158/2018/NCA/PFANTAQ/PGF/AGTU se ressaltou que o assunto foi trazido ao conhecimento da ANTAQ em razão de seu poder fiscalizatório em relação ao cumprimento do Convênio de Delegação. e que eventual apuração de responsabilidades ficaria a cargo da ANTAQ. A par de medidas cautelares que deviam ser adotadas pela Agência para evitar nova transferência de recursos e determinar a devolução dos valores, devidamente atualizados, como as receitas portuárias pertenciam à União, cabia dar ciência do assunto ao Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil – MTPAC para que tomasse as providências necessárias.
12. Ao tempo em que instaurou a URESL os presentes autos, de nº 50300.011803/2018-11, com o Auto de Infração nº 3309-0 (SEI 0539975) para apuração de possível descumprimento da Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, do Convênio de Delegação nº 16/2000, a SFC (SEI 0538915) corroborou os entendimentos técnicos e jurídicos anteriores e sugeriu ao Gabinete do Diretor-Geral ações junto ao Ministério dos Transportes e adoção de medidas cautelares.
13. Em outro momento, a URESL, pelo Ofício nº 198/2018-PRE-EMAP (SEI 0542761), tomou conhecimento de outra transferência de recursos financeiros da EMAP ao Tesouro do Estado do Maranhão, nos mesmos moldes das anteriores, no valor de R$ 80.000.000,00 (oitenta milhões de reais), a título de Juros Sobre Capital Próprio.
14. Naqueles autos foi exarada a Resolução nº 6.464/2018-ANTAQ (SEI 0613892), publicada no DOU de 19/10/2018 (SEI 0621147), encaminhada à EMAP e ao MPTAC pelos Ofícios nº 637 (SEI 0621161) – retificado pelo de nº 738 (SEI 0640411) – e nº 638/2018/SGE-ANTAQ (SEI 0621216), tendo sido os autos encaminhados à URESL para conhecimento da Resolução pelo Despacho SFC (SEI 0622901).
RESOLUÇÃO Nº 6.464-ANTAQ, DE 17 DE OUTUBRO DE 2018.
O DIRETOR-GERAL DA AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES AQUAVIÁRIOS – ANTAQ, no uso da competência que lhe é conferida pelo inciso IV do art. 20 do Regimento Interno, considerando o que consta do Processo nº 50300.006065/2018-90, e tendo em vista o deliberado pela Diretoria Colegiada em sua 450ª Reunião Ordinária, realizada em 10/10/2018,
Resolve:
Art. 1º Determinar à Empresa Maranhense de Administração Portuária – EMAP que se abstenha, até final decisão, de realizar, por quaisquer meios, a transferência ao Estado do Maranhão de recursos de sua receita tarifária, oriundas do Convênio de Delegação nº 016/2000.
Art. 2º Esta resolução entrará em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União – DOU.
MÁRIO POVIA
Diretor-Geral
15. Importa salientar que pelo Termo de Reunião, Conexão e Continência (SEI 0599563 e 0599639) entendeu-se pela reunião dos Processos nº 50300.006065/2018-90 e nº 50300.011803/2018-11 a fim de evitar decisões divergentes.
Do Processo nº 50300.011803/2018-11
16. O Presente Processo Sancionador foi instaurado pelos seguintes Fatos:
Fato 1 – A Empresa Maranhense de Administração Portuária – EMAP, Autoridade Portuária do Porto de Itaqui/MA, interveniente delegatária do Convênio de Delegação nº 16/2000, transferiu irregularmente, em 22/12/2017 e 17/01/2018, recursos portuários advindos da exploração das áreas e instalações portuárias sob sua administração para o tesouro do Estado do Maranhão, no valor de R$ 37.168.925,49 (trinta e sete milhões cento e sessenta e oito mil novecentos e vinte e cinco reais e quarenta e nove centavos), a título de Juros Sobre Capital Próprio, conforme Ofício nº 15/2018-GEJUR/EMAP, Ofício nº 702/2017-GAB/SEPLAN e Ofício nº 139/2018-PRE/EMAP, em contrariedade a determinação expressa no Convênio, Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo:
Parágrafo Segundo – Será receita portuária, a ser administrada pela EMAP, toda remuneração proveniente do uso da infraestrutura aquaviária e terrestre, arrendamento de áreas e instalações, armazenagem, contratos operacionais, aluguéis e projetos associados, a qual deverá ser aplicada, exclusivamente, para o custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimentos no Porto e demais áreas delegadas.
Fato 2 – A EMAP transferiu, logo após o dia 29/05/2018, recursos portuários advindos da exploração das áreas e instalações portuárias sob sua administração para o tesouro do Estado do Maranhão, no valor de R$ 80.000.000,00 (oitenta milhões de reais), a título de Juros Sobre Capital Próprio, conforme Deliberação nº 6 do Conselho de Administração da EMAP, de 28/05/2018, e Parecer do Conselho Fiscal de 29/05/2018, embasados no Ofício nº 347/2018-GAB/SEPLAN, de 24 de maio de 2018, em contrariedade a determinação expressa no Convênio, Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo.
17. A equipe de fiscalização lavrou o Auto de Infração – AI nº 3309-0/2018/URESL (SEI 0539975) em 06/07/2018, recebido na EMAP em 09/07/2018 (SEI 0542906), com data de infração para o Fato 1 em 22/12/2017 e 17/01/2018, e para o Fato 2 em 29/05/2018, por descumprimento do Convênio de Delegação nº 16/2000, incorrendo a EMAP em infração tipificada pelo art. 33, inciso XX, da norma aprovada pela Resolução nº 3.274/2014-ANTAQ:
RESOLUÇÃO Nº 3.274-ANTAQ, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2014. (Alterada pela Resolução Normativa nº 02-ANTAQ, de 13 de fevereiro de 2015 e retificada pela Resolução Normativa nº 15-ANTAQ, de 26 de dezembro de 2016).
Artigo 33. Constituem infrações administrativas da Autoridade Portuária, sujeitando-a à cominação das respectivas sanções:
XX – deixar de aplicar os recursos financeiros, inclusive os provenientes de alienação e baixa de bens, conforme sua destinação e prazos estabelecidos no contrato de concessão ou convênio de delegação: multa de até R$ 100.000,00 (cem mil reais);
18. Em Defesa ao AI (SEI 0567134), a autuada alegou que:
a) Foi criada como empresa pública unipessoal, com capital subscrito e integralizado exclusivamente pelo Estado do Maranhão;
b) Com base na Lei nº 6.404/1976, que disciplinava a integralização de resultados e a redução de capital social das empresas, configurava-se juridicamente possível a destinação de resultado líquido das empresas públicas estaduais ao seu único e exclusivo ente controlador, o Estado do Maranhão;
c) O Parecer Jurídico nº 2771/2017-ASS-PGE/MA (SEI 0476017), elaborado pela Procuradoria-Geral do Estado do Maranhão, reconhecia o dever da EMAP em cumprir com o Convênio de Delegação nº 16/2000, especificamente na Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, segundo o qual
toda remuneração proveniente do uso da infraestrutura aquaviária e terrestre, arrendamento de áreas e instalações, armazenagem, contratos operacionais, aluguéis e projetos associados, advinda da utilização do imóvel objeto do convênio somente poderá ser aplicada para o custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimentos no Porto e demais áreas delegadas;
d) Todavia, eventuais receitas obtidas pela aplicação financeira sobre fundos, reservas e provisões ainda não revertidas para o custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimento no Porto e demais áreas delegadas eram passíveis de ser transferidas ao ente controlador;
e) Assim, os valores originados por aplicações financeiras sobre o acúmulo de saldos positivos, capitalizados ao longo dos anos, poderiam ser repassados ao único acionista da EMAP, na forma de Juros Sobre Capital Próprio (JSCP), definida como remuneração ao órgão controlador pelo capital investido no empreendimento.
19. Pelo Parecer Técnico Instrutório nº 18/2018/URESL/SFC (SEI 0584666), corroborado pelo Despacho de Julgamento nº 12/2018/URESL/SFC (SEI 0591064), concluiu-se que a transferência de recursos portuários pela EMAP para o Tesouro do Estado do Maranhão, em valor superior a R$ 141 milhões, a título de Juros sobre Capital Próprio, em contrariedade a determinação expressa da Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, do Convênio de Delegação nº 16/2000, configurava a autoria e materialidade da infração do art. 33, XX, da Resolução nº 3.274/2014-ANTAQ.
20. Objetou-se que todos os relatórios produzidos pelo setorial técnico da SFC e PFA compunham sólida base técnica e jurídica a subsidiar a decisão no Processo Sancionador. Quanto ao Parecer elaborado pela Procuradoria do Estado do Maranhão (SEI 0476017), que discorria acerca das constituições societárias de empresas públicas do Maranhão e suas possibilidades legais de remunerações aos respectivos entes controladores, não era o caso do Porto do Itaqui. Argumentou-se que o Porto não foi construído e aparelhado exclusivamente pelo Estado do Maranhão, mas era um porto público federal, construído e aparelhado com recursos federais, cuja exploração e administração foi concedida ao Estado do Maranhão que, por conveniência e oportunidade, criou a EMAP, empresa pública estadual destinada a executar aquela tarefa.
21. Tampouco receitas financeiras aplicadas sobre reservas e fundos poderiam ser transferidas ao Estado do Maranhão, consoante Despacho URESL (SEI 0476245) e Parecer Técnico Instrutório nº 18/2018/URESL/SFC (SEI 0584666), pois não ocorria transformação de natureza jurídica das receitas portuárias quando acrescidas de juros por aplicações no mercado financeiro. No entender da URESL, o acessório seguia o principal, assim as receitas financeiras derivadas das portuárias deviam seguir a mesma destinação do principal, não havendo que se falar em alteração dessa lógica pelo fato de a expressão “receita financeira” não estar literalmente escrita no texto do Parágrafo Segundo da Cláusula Terceira do Convênio de Delegação.
22. Afirmou-se que toda e qualquer receita percebida pela EMAP no exercício da exploração e administração do Porto do Itaqui e demais estruturas federais delegadas eram receitas portuárias, e também o eram receitas advindas de aplicações financeiras sobre esse capital, uma vez que geradas a partir delas. O conceito contábil de Juros Sobre Capital Próprio representava forma específica de cálculo, com metodologia e limites definidos em lei, para remunerar titular, sócios ou acionistas pelo capital efetivamente investido na empresa.
23. Não fazia sentido justificar transferências de recursos financeiros da EMAP para o Tesouro sob a forma de Juros Sobre Capital Próprio, uma vez que todo o capital do Porto foi formado pela reaplicação das receitas portuárias, e não por aporte de recursos do Estado do Maranhão, e que o patrimônio do Porto e demais estruturas delegadas pertenciam à União, e não àquele Estado.
Das Alegações da Recorrente em Recurso
24. Em sede de Recurso Administrativo (SEI 0614933), a Recorrente alega:
a) Com base na Lei nº 6.404/1976, que disciplina a integralização de resultados e a redução de capital social das empresas, configura-se juridicamente possível a destinação de resultado líquido das empresas públicas estaduais ao seu único e exclusivo ente controlador, o estado do Maranhão;
b) Eventuais receitas obtidas pela aplicação financeira sobre fundos, reservas e provisões ainda não revertidas para o custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimento no Porto e demais áreas delegadas são passíveis de serem transferidas ao ente controlador;
c) Os valores originados por aplicações financeiras sobre o acúmulo de saldos positivos, capitalizados ao longo dos anos, poderiam ser repassados ao único acionista da EMAP, na forma de Juros Sobre Capital Próprio – JSCP, definida como remuneração ao órgão controlador pelo capital investido no empreendimento;
d) Por fim, argumenta que empreendeu melhorias no porto e que o recurso transferido não afetou os investimentos programados, pedindo a anulação do Auto de Infração.
Da Apreciação desta Autoridade Julgadora Recursal
25. Preliminarmente, não detectei qualquer mácula concernente aos procedimentos adotados na instrução processual, estando os autos aptos a receberem julgamento em sede de Recurso. Verifico que os atos e prazos normativos garantiram o direito ao contraditório e à ampla defesa da empresa, em fiel cumprimento ao devido processo legal.
26. No mérito, identifico que a questão envolve a conduta perpetrada pela EMAP de transferir recursos portuários advindos da exploração das áreas e instalações portuárias sob sua administração para o Tesouro do Estado do Maranhão, a título de Juros Sobre Capital Próprio, caracterizando a infração tipificada no art. 33, inciso XX, da norma aprovada pela Resolução nº 3.274/2014-ANTAQ.
27. Repiso que pelo Termo de Reunião, Conexão e Continência SGE (SEI 0599563 e 0599639) entendeu-se pela reunião dos Processos nº 50300.006065/2018-90 e nº 50300.011803/2018-11 a fim de evitar decisões divergentes. Impende notar ainda que pelo Despacho GFP (SEI 0643190) e Despacho SFC (SEI 0643461), consultou-se a Procuradoria Federal junto à ANTAQ – PFA nos seguintes termos:
a) O recurso interposto nos presentes autos pode vir a ser julgado pela GFP com base na tipificação exposta no Auto de Infração n° 003309-0 (SEI nº 0539975) ou seria necessário o sobrestamento destes autos até decisão final da diretoria conforme estabelecido na posterior Resolução 6464/2018-ANTAQ?
b) Em caso de necessidade de sobrestamento dos presentes autos, a tipificação da conduta estabelecida no Auto de Infração (inciso XX do art. 33 da norma aprovada pela Resolução 3.274-ANTAQ) poderia ser mantida, não havendo necessidade de alteração para a tipificação constante no inciso XXXVIII do art. 32 da norma aprovada pela Resolução 3.274-ANTAQ, tendo em vista que a cautelar exarada na Resolução nº 6464/2018 fora posterior ao cometimento das infrações?
28. Em resposta, a PFA emitiu a Nota Jurídica nº 402/2018/NCA/PFANTAQ/PGF/AGU (SEI 0665152), ressaltando que no Processo nº 50300.006065/2018-90 a Diretoria teria deferido cautelar na Resolução nº 6.464/2018-ANTAQ tão-somente para determinar que a EMAP suspendesse a realização de novas transferências ao Estado do Maranhão de recursos de sua receita tarifária, mas que competia à SFC lavrar auto de infração e aplicar penalidades no âmbito de suas competências, propor sua aplicação quando a conduta infracional fosse apurável no âmbito das competências da Diretoria, e julgar recursos interpostos contra decisões das instâncias inferiores.
29. Asseverou haver conexão entre os objetos dos dois Processos, por se basear a causa de pedir de ambos na realização de transferências supostamente irregulares de recursos da receita tarifária da EMAP ao Estado do Maranhão; todavia, se havia indícios da prática de infração, cabia a atuação da SFC e seus órgãos subordinados para apurar a suposta irregularidade e eventualmente subsidiar decisão da Diretoria. Dessa forma, recomendou que o Processo nº 50300.006065/2018-90 fosse sobrestado para aguardar o pronunciamento definitivo nestes autos, devendo a GFP prosseguir no julgamento do recurso interposto pela EMAP, cabendo-lhe, se fosse o caso, alterar a classificação infracional do AI nº 3309-0 e impor a penalidade ou recomendar sua imposição à autoridade competente.
30. Nessa toada, adoto os argumentos da Autoridade Julgadora Originária no Despacho URESL (SEI 0616198), em que se analisou o Recurso. Desse modo, apuro que, em Recurso Administrativo, a Recorrente se limitou a reiterar as alegações apresentadas anteriormente em Defesa ao Auto de Infração.
31. Conforme Convênio de Delegação nº 16/2000, Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, toda remuneração proveniente do uso da infraestrutura do Porto era receita portuária, a ser administrada pela EMAP, e aplicada, exclusivamente, para o custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimentos no Porto e demais áreas delegadas, o que foi defendido pela PFA no Parecer Jurídico nº 70/2018/NCA/PFANTAQ/PGF/AGU (SEI 0538127), no Processo nº 50300.006065/2018-90. O patrimônio do Porto e demais estruturas delegadas pertenciam à União, e todo o capital do Porto do Itaqui foi formado pela reaplicação das receitas portuárias, e não por aporte de recursos do Estado do Maranhão, não havendo que se falar de transferências desses recursos financeiros para o Tesouro do Estado do Maranhão sob a forma de Juros Sobre Capital Próprio.
Das Circunstâncias Atenuantes e Agravantes
32. Considerando o que consta do Parecer Técnico Instrutório nº 18/2018/URESL/SFC (SEI 0584666), corroborado pelo Despacho de Julgamento nº 12/2018/URESL/SFC (SEI 0591064), e das Tabelas de Dosimetria (SEI 0586282 e 0586285); bem como o disposto no art. 52, §2º, I, e §4º, da norma aprovada pela Resolução nº 3.259/2014-ANTAQ, estou de acordo com as agravantes, quais sejam:
I – Quatro ocorrências de reincidência genérica caracterizadas pela aplicação de penalidade de multa nos Processos nº 50308.000036/2015-18 (acórdão publicado no DOU em 17/11/2016), 50308.002627/2014-22 (acórdão publicado no DOU em 16/06/2015), 50308.001593/2012-97 (acórdão publicado no DOU em 22/04/2015) e 50308.001598/2012-10 (acórdão publicado no DOU em 21/05/2015);
II – Exposição a risco ou efetiva produção de prejuízo à segurança e à saúde pública, ao meio ambiente, ao serviço, ao patrimônio público, aos usuários ou ao mercado, nos termos do Parecer Técnico Instrutório nº 18/2018/URESL/SFC (SEI 0584666):
4. Art. 52, § 2, I – exposição a risco ou efetiva produção de prejuízo à segurança e à saúde pública, ao meio ambiente, ao serviço, ao patrimônio público, aos usuários ou ao mercado;
5. A transferência de recursos ocorrida, além de ferir determinação expressa do convênio de delegação, ocasiona prejuízo ao patrimônio da União, aos usuários do sistema logístico coberto pelo Porto do Itaqui e demais instalações delegadas, bem como ao mercado de toda sua hinterlândia.
6. Primeiramente, em termos da lógica econômica da delegação de estruturas portuárias federais aos estados-membro, conforme explicitado no Despacho URESL (SEI 0476245):
“cabe ressaltar que a tese exposta pelo Estado do Maranhão lesa o patrimônio da União que lhe foi delegado. A função das aplicações financeiras do capital, formado pela acumulação das receitas portuárias obtidas na exploração da infraestrutura portuária que foi delegada à EMAP, é em boa parte a de garantir a manutenção de seu poder de compra real em face da inflação anual. Assim, a retirada dos rendimentos financeiros do capital aplicado significa em termos reais sua diminuição anual, com a corrosão de seu valor pela desvalorização monetária. A parte dos rendimentos financeiros que exceder a reposição da inflação constitui remuneração do custo de oportunidade de se ter esse capital, formado da acumulação das receitas portuárias, parado, ao invés de estar sendo investido na modernização e ampliação do porto, das demais áreas delegadas e dos serviços portuários disponíveis ao mercado.
Igualmente aqui, não faz sentido algum retirar essa remuneração do custo de oportunidade deste capital do Porto para repassá-lo ao Estado do Maranhão, que, lembra-se de passagem, recebeu da União o Porto, com todas as suas instalações, sem qualquer contrapartida financeira e sem ter aportado capital próprio. Como a própria Procuradoria do Estado admite, o capital do porto, sob guarda da EMAP, é formado pelas estruturas originais que foram delegadas, mais a acumulação das receitas portuárias que não foram ainda aplicadas em projetos no próprio porto. A única contrapartida que a EMAP tem de dar à União é exatamente a reaplicação de todos os valores obtidos em razão da delegação nas próprias instalações portuárias delegadas, visando o aprimoramento do sistema logístico nacional e o desenvolvimento do próprio Estado do Maranhão.
Na operação de Juros sobre Capital Próprio a situação é ainda pior sob o ponto de vista econômico e financeiro da União. Não apenas a receitas de aplicações financeiras seriam possíveis de repasse ao tesouro do Estado do Maranhão, como as receitas financeiras no sentido contábil e calculadas sobre o Patrimônio Líquido seriam transferíveis a este ente da federação, com redução do patrimônio líquido e do disponível da EMAP, afetando suas possibilidades de reinvestimento no Porto e demais instalações portuárias delegadas de forma ainda mais incisiva que o mero repasse dos resultados de suas aplicações financeiras.” (grifos do original)
7. Neste sentido, também já se posicionou o Chefe da URESL, em seu Despacho URESL (SEI 0477199):
De acordo com o Relatório de Atividades da EMAP referente ao ano de 2017, as despesas de capital tiveram o correspondente a investimento com recursos próprios no valor global de R$ 39.617 (trinta e nove milhões seiscentos e dezessete mil reais). O Lucro Líquido do período foi de R$ 51.601 (cinquenta e um milhões seiscentos e um mil reais). O valor dos Juros sobre Capital Próprio (JSCP) já contabilizado como obrigação a pagar do exercício de 2017 foi de R$ 23.989 (vinte e três milhões novecentos e oitenta e nove mil reais). Ou seja, o Juros sobre Capital Próprio a ser transferido (JSCP) equivale a 61% do investimento realizado no Porto e a 47% do Lucro Líquido do período (SEI 0479771).
A nova política contábil adotada pela EMAP, que resulta na transferência de recursos financeiros ao Tesouro do estado do Maranhão, sob a forma de Juros sobre Capital Próprio (JSCP) a cada final de exercício contábil, resulta em subtração significativa de recursos prévia e legalmente alocados para realização de despesas com custeio das atividades delegadas, manutenção das instalações e investimentos na ampliação e modernização da infraestrutura e superestrutura portuária.
A reaplicação das receitas portuárias no próprio Porto, como expresso através da Clausula Terceira, Parágrafo Segundo do Convênio de Delegação nº 016/2001 (SEI 0476072), significa salvaguardar as razões e princípios que fundamentaram a Concessão do Porto Público e demais estruturas delegadas ao estado do Maranhão. O maior benefício a ser percebido pelo estado é a dinamização econômica de extensa área de influência do Porto do Itaqui, produzida por uma gestão eficiente que universalize o acesso aos serviços portuários com níveis crescentes de eficiência e produtividade.
8. Tal prejuízo independe da eventual melhoria geral de gestão, informada nos ofícios n. 00225/2018-PRE/EMAP (SEI 0554675) e n. 248/2018-EMAP (SEI 0574298), e que de certa forma teria absorvido o efeito do repasse dos recursos ao tesouro do estado, alegadamente evitando-se implicações ao plano de investimentos e às atividades de custeio e manutenção nas áreas delegadas. As economias indicadas pela Autoridade Portuária Delegatária não configuram uma justificativa para o repasse irregular dos recursos “sobrantes” ao Estado do Maranhão, mas deveriam igualmente ser integralmente revertidas no próprio porto e demais instalações.
9. Neste sentido, conforme explicitado no Relatório de Fiscalização Portuária – FIPO nº 20/2018/URESL/SFC (SEI 0580407), no Relatório Fotográfico SEI 0562249 e nas demais fiscalizações programadas e eventuais ocorridas perante a Autuada, o Porto do Itaqui e as instalações delegadas estão longe de já apresentarem estados de perfeição, que não necessitaria de mais investimentos em sua melhoria e expansão. A título de exemplo, citam-se os enormes buracos nas áreas de acesso e estacionamento dos arrendamentos de granéis líquidos. Ou a limpeza da vegetação. Ou mesmo a expansão da pavimentação para áreas de futuros arrendamentos. Sem falar em treinamentos, atualização de equipamentos portuários e mesmo administrativos etc.
10. A decisão concreta sobre estes investimentos e atividades cabe à EMAP enquanto Autoridade Portuária, não podendo esta ANTAQ se imiscuir nos detalhes da oportunidade e conveniência de suas decisões discricionárias. No entanto, a decisão de utilizar os recursos advindos da exploração do porto para a indevida integralização de capital e repasse direto ao governo do Estado do Maranhão sob o argumento de que simplesmente não haveria sua necessidade para investimentos e atividades não corresponde à realidade do Porto do Itaqui.
11. Por fim, ainda que realmente não houvesse qualquer necessidade desses mais de 140 milhões de reais para investimentos úteis nas instalações delegadas, a decorrência lógica deste excesso de acumulação deveria ser a redução das tarifas aos usuários do sistema. O argumento de que na comparação com a média dos portos nacionais a EMAP pratica tarifas relativamente baixas não tem qualquer relevância neste sentido, já que os valores das tarifas devem ser definidos em relação a seus próprios custos e necessidades de investimentos, não na comparação com outros entes. Para a exploração e administração do Porto do Itaqui e demais áreas delegadas estaria ocorrendo um excesso de entrada anual de recursos tarifários e de pagamentos de arrendamentos na ordem de dezenas de milhões de reais que, na argumentação da própria Autuada, não são necessários à expansão e manutenção das instalações sob sua responsabilidade. A Delegatária deve ser superavitária. Mas apenas para cobrir seus próprios gastos e atividades que lhe foram atribuídas por Lei e pelo Convênio, de desenvolvimento do sistema logístico regional, não de gerar lucros para repasse ao caixa único do tesouro do Estado.
12. Destarte, o repasse desses recursos no lugar de realização de outros investimentos ou atividades de custeio e manutenção, ou no lugar da redução das tarifas e preços aos usuários das áreas administradas pela Autuada causa prejuízo ao patrimônio público da União, aos usuários e ao mercado, nos termos do art. Art. 52, § 2, I da Resolução 3259/2014-ANTAQ.
CONCLUSÃO
33. Dessa forma, considerando o que dos autos consta, DECIDO por conhecer o Recurso interposto, uma vez que tempestivo, e no mérito, negar-lhe provimento, consignando pela aplicação da penalidade de MULTA no valor de R$ 125.180,56 (cento e vinte e cinco mil cento e oitenta reais e cinquenta e seis centavos) à Empresa Maranhense de Administração Portuária – EMAP, CNPJ nº 03.650.060/0001-48, por transferir recursos financeiros da exploração de áreas e instalações portuárias sob sua administração para o Tesouro do Estado do Maranhão, a título de Juros Sob Capital Próprio, referente aos exercícios contábeis dos anos de 2015 a 2017, descumprindo a Cláusula Terceira, Parágrafo Segundo, do Convênio de Delegação nº 16/2000, pela prática da infração prevista no art. 33, inciso XX, da Resolução Nº 3.274/2014-ANTAQ.
34. DECIDO também por determinar à EMAP que se abstenha de realizar, a qualquer título, transferência de receitas portuárias, oriundas do Convênio de Delegação nº 16/2000, ao Estado do Maranhão e ao próprio patrimônio da EMAP.
35. Certifico, para todos os fins, que, na data de hoje, atualizei o Sistema de Fiscalização da ANTAQ, de acordo com o julgamento do presente Despacho.
NEIRIMAR GOMES DE BRITO
Gerente de Fiscalização de Portos e Instalações Portuárias – GFP
Publicado no DOU de 02.01.2019, Seção I
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